Marcelo Jabulas | @mjabulas – O que move qualquer indústria é o interesse de consumo sobre aquilo que é fabricado. Do Ferro-gusa ao iPhone, só se fabrica o que há demanda. Na indústria dos games, a lógica não é diferente. E na mesa da diretoria da Slightly Mad Studios, que hoje pertence à conterrânea Codemasters, foi escrito em letras garrafais que a Project CARS precisava mudar de foco para vender mais.
E é fato que muita gente está com cara fechada pelo fato de Project CARS 3 ter deixado de ser um simulador para se tornar um SimCade (intermediário entre simulador e arcade), aos moldes de Gran Turismo e Forza Motorsport. De fato, a franquia vem passando por uma metamorfose desde o título de estreia. Quando foi publicado em 2015, o primeiro Project chamava atenção para seu nível de dificuldade elevado, física e gráficos refinados.
Era um game difícil demais para ser jogado. Quem quisesse prosperar precisaria se dedicar à exaustão. Não era impossível, mas quem não tinha muito entusiasmo e queria apenas brincar de corridinha não se arriscava. Mesmo assim vendeu cerca de 2 milhões de cópias em seu primeiro ano de mercado, que não é um número modesto. Pelo contrário, um número relevante para um simulador. Seu rival Assetto Corsa vendeu 1,4 milhão, o que também não é pouco.
Amigável
Em 2017, quando publicou Project CARS 2, a produtora britânica viu que era preciso conversar com dois mundos ao mesmo tempo: os jogadores de simuladores e aqueles que queriam um game desafiador, mas não torturante. A solução foi aplicar um sistema de assistências que equilibrava o nível de realismo e dificuldade do jogo.
Para o jogador freguês da franquia, a grande novidade era o clima e passagem de tempo dinâmicos. Isso exigia estratégia de boxes, pois era preciso estar atento a trocas de pneus repentinas, que elevavam o realismo da corrida e a dificuldade do game.
E apesar de ser um belo jogo, com uma lista formidável de automóveis e notas elevadas, PC2 acabou não sendo o gol de placa que se imaginava, por dois motivos. O jogador de PC1 e Assetto ficou ressabiado em apostar num game que poderia perder seu grande diferencial, que era a simulação. O segundo ponto é que ele chegou praticamente junto de Gran Turismo Sport e Forza Motorsport 7, os grandes exclusivos de Sony e Microsoft.
Project CARS 3
Agora, Project CARS 3 estreia com uma proposta ainda mais voltada para o SimCade, seguindo um caminho que também foi adotado nas produções da Codemasters. Grid mudou de foco e Dirt 5, que estreia em outubro, e também adotou uma jogabilidade mais casual. Quem jogou Dirt Rally 2.0 sabe o quão difícil é manter seu carro na pista. Completar o estágio já é uma vitória.
A Codemasters teve grande sucesso com Dirt 3 e viu seus números retrocederem nos títulos subsequentes. Além disso, os SimCade vendem bem. GT Sport vendeu 8 milhões de cópias. E olha é que é o segundo pior resultado da franquia, que já acumula 85 milhões de unidades, em seus quase 25 anos de mercado.
E PC3 busca esse novo formato. Logo de cara traz elementos que buscam uma relação mais imersiva com o jogador. É possível escolher seu piloto, com sexo, raça e tipos de uniformes.
Auto-escola
Em seguida no tutorial, o jogador tem quatro níveis de dificuldade para escolher. Ou seja, ele simplifica os incontáveis ajustes de seu antecessor para perfis pré-definidos. Assim, o mais leigo dos jogadores sabe exatamente em que opção ele se enquadra.
Na primeira prova do jogo, há instruções simples de condução em pista, como pontos de tangência, momento de frenagem, sustentação da velocidade e aceleração. Mas de forma bem didática, mas que basicamente faz os mesmos que os cones de GT Sport.
Primeira impressão
Chama atenção que no lugar de um circuito real, trata-se de um traçado urbano, com poucas curvas, à bordo de um Chevrolet Corvette C8, que não espanta o jogador logo na primeira impressão. Quem jogou PC2 deve se lembrar que o primeiro conteúdo disponível era uma prova no traçado urbano de Long Beach com muretas por toda extensão e um McLaren 650 indócil que não pensava duas vezes em acabar com a brincadeira.
O game oferece ao jogador a possibilidade de adquirir e modificar seus carros. É possível trocar componentes e modificar a estética do carro, numa sacada que Gran Turismo faz desde os anos 1990 e que foi a fórmula para que Need For Speed fosse a franquia de corridas mais popular do planeta, com 150 milhões de games vendidos desde 1994.
Na lista inicial é possível levar para casa um Toyota 86, assim como um Mitsubishi Lancer Evolution VI T.M.E. (Tommi Mäkinen Edition) ou Honda Civic Type-R (da nona geração). Depois disso é começar a “pentear” seu possante. Mas fique tranquilo, são pelo menos 200 carros, de diferentes categorias e quase 150 traçados, incluindo autódromos, como Interlagos.
Jogabilidade
Comparado ao primeiro game, Project CARS 3 é um passeio no parque. Em nosso teste, optamos pelo modo mais purista, com qualquer tipo de assistência desabilitada. E mesmo assim, domar o carro não exigiu grande esforço. Se nos dois primeiros games toda curva deveria ser calculada com o máximo de precisão, agora tudo ficou mais fácil.
Ele te permite forçar o carro ao extremo. Se entrar quente demais, deixe a traseira se soltar e conserte no contra-esterço. Se bater, sem problemas, os danos são apenas cosméticos. Tente isso em PC1 ou PC2. O melhor cenário é rodar sem tocar em nada e ter a chance de pelo menos completar a prova.
E por falar em prova. As corridas também seguem o padrão SimCade. Nada de etapas com dezenas de voltas (apesar de os antecessores permitirem reduzir o percentual das corridas). Cada corrida tem duas voltinhas. Mas cuidado, pois um erro pode custar posições e o amigo não terá tempo para se recuperar.
Campanha
Se no primeiro game, a imersão se dava pelos e-mails da equipe e patrocinadores, assim com nas manchetes dos noticiários e postagens de redes sociais e nas ofertas de contratos, assim como os infinitos ajustes para cada prova. Agora tudo se resume à escalada do jogador e sua garagem.
Para avançar de uma competição para outra, são necessários créditos, assim como recursos para turbinar a garagem. Uma lógica de jogo muito parecida com a do primeiro Grid, de 2007.
Visual
Project CARS 3 é um jogo bonito, como seus antecessores também continuam sendo. Mas é nítido o melhor polimento dos carros, assim como cenários mais coloridos, uma vibe de Forza Horizon, Need For Speed e The Crew, assim como a edição mais atual de Grid e o futuro Dirt 5.
Palavra Final
Project CARS 3 é um game completamente diferente do que a franquia já tinha produzido. Para quem é fã de simulação, o jogo pode ser uma grande decepção. No entanto, é um game amigável para quem gosta de jogos de corrida, mas nunca terá como prioridade montar um kit com banco, pedaleira, volante, um monte de monitores e passar o sábado ajustando o carro. É um game para quem gosta de videogame, carros legais, mas sem compromisso com realismo. É ligar e jogar.
Com versões para PC, PS4 e Xbox One, com preços entre R$ 250 a R$ 395.